segunda-feira, 26 de março de 2007

LEI NOVA PARA CONSERTAR O PAÍS

Anselmo Oliveira

“Por que não propõem uma lei tipificando todo e qualquer desvio de verbas públicas como crime hediondo...?”



O debate histérico da mídia que coloca como bola da vez a redução da maioridade penal como forma de acabar a violência no Brasil é mais uma de tantas idéias alopradas que os meios de comunicação, com os seus interesses econômicos imediatos, compram e buscam revender para garantir o lucro. Lucro estimado pelo aumento da audiência e da venda de exemplares de revistas e jornais, consequentemente pelo fortalecimento da relação comercial junto aos seus patrocinadores e sua carteira de anunciantes.

Esta é uma ferida antiga, desde que a imprensa passou a produzir dentro das regras capitalistas, ou seja, a imprensa também é um negócio. Um bom negócio. Tanto é que se discute sem desfaçatez a abertura do capital das empresas de comunicação, e até mesmo o Congresso Nacional deu uma mãozinha para permitir investimento estrangeiro neste setor da economia.

A contradição que se vive entre os interesses mercantis dos veículos e os ideais dos profissionais da comunicação ainda será objeto de estudos severos na área da psicanálise, quem sabe mesmo da psiquiatria.

Vendem-se neste momento a idéia quase fixa - ou seria uma mania na linguagem psiquiátrica? – de que a solução de todos os problemas da segurança pública está no endurecimento das leis penais, inclusive na redução da lei penal para encarcerar os adolescentes a partir dos 16 anos.

A imprensa nacional, consciente ou não, isso somente o tempo e a história dirão, está defendendo o Estado Policial como saída. O mesmo tipo de Estado que em passado recente desde a ditadura de Getúlio Vargas e o seu DIP, a polícia política que controlava os meios de comunicação à época, e do SNI juntamente com os censores da Polícia Federal da época da ditadura militar, calaram jornalistas como Wladimir Herzog e tantos outros e excluíram da cidadania brasileira o direito de expressão e a liberdade de imprensa.

O feitiço pode, então, virar contra o feiticeiro. O crescimento de um Estado Policial que busque resolver tudo através do direito penal poderá calar as vozes democráticas dos defensores de medidas propostas de afogadilho.

A Constituição brasileira de 1988 traz em seu texto e no seu contexto a inauguração de um Estado Social que nunca saiu da norma, nos conformamos com o atraso e a pobreza que remete aos primórdios do Estado Moderno logo após às revoluções liberais da Inglaterra, dos Estados Unidos e da França.

É fácil verificarmos que as leis deste País não se tornam realidades, exaurem-se na mera positividade. Exemplos como a Lei das Execuções Penais e do Estatuto da Criança e do Adolescente, onde o Estado deveria cumprir o que legislou nega o cumprimento e cria o caos que atualmente estamos vendo.

A violência e a criminalidade que estamos a assistir é o preço que a sociedade paga por ter políticos despreparados, administradores públicos argentários e corruptos, empresários insaciáveis e cúmplices da roubalheira dos recursos públicos.

Agora se reclama da falta de recursos para resolver problemas na educação, na saúde, no sistema penitenciário e no atendimento das crianças e adolescentes em situações de risco.

A minha proposta é simples. Não acham que a lei penal pode resolver? Por que não propõe uma lei tipificando todo e qualquer desvio de verbas públicas como crime hediondo, punido com pena mínima de 15 anos e máxima de 30 anos de prisão em regime totalmente fechado, e ainda, multa equivalente a duas vezes o valor do desvio, e como pena acessória a suspensão dos direitos políticos pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade aplicada?

O resultado seria quase que de imediato. Sobrariam muitos bilhões de reais para serem aplicados de maneira correta. Talvez assim, o direito penal, enfim resolva o problema da violência e da criminalidade.

Duvido mesmo é que o Congresso que aí está faça uma proposta destas. Duvido mesmo que os veículos de comunicação dêem o mesmo destaque que vem dando à redução da maioridade penal.

Algum senador ou deputado federal se habilita?

quinta-feira, 8 de março de 2007

A MULHER COMO SUJEITO DO DIREITO

Anselmo Oliveira

No Dia Internacional da Mulher assisti no Auditório da Faculdade de Sergipe – FaSe, em Aracaju, uma mesa poderosa formada por quatro mulheres, professoras daquela instituição de ensino superior, uma antropóloga, a mestre e doutoranda Fátima Lima Santos, a turismóloga Gabriela Nicolau e a doutora em direito penal Daniela Costa, sob a mediação da doutora em psicologia Giovana Perlin.

O mais importante desse evento foi ouvir o que dizem as mulheres que fazem a academia numa perspectiva de reflexão. Há bem pouco tempo a data era “comemorada” com uma postura ativista, de luta pelos direitos que queriam ver conquistados, ou barganhados numa leitura política dos homens entronizados no poder.

A perspectiva de sujeito e não de objeto (ou seria de objetivação) principalmente pelo direito foi o grande momento e sinaliza para uma tomada de consciência nova que certamente contribuirá para a redução do preconceito e da desigualdade ainda presentes em nossa sociedade.

As conquistas recentes no campo legislativo e, portanto, jurídico, iniciadas na década de 30 no Brasil, com o Estatuto da mulher casada, e que mais recentemente se vislumbra no Código Civil de 2002, após décadas de ausência no ordenamento civil de 1916, e a Lei Maria da Penha de 2006, uma virada paradigmática, onde a mulher até que enfim se torna sujeito perante o direito pátrio.

Não creio, como disse muito bem a professora Daniela Costa, que a lei por si só resolverá a grave situação da violência doméstica onde a mulher aparece como a maior vítima. É que o problema está na raiz da nossa experiência como sociedade, culturalmente necessitamos desconstruir todas as concepções e compreensões equívocas da nossa formação.

Espero que os sujeitos que exercem papéis significativos na política, na administração pública, na justiça e na polícia, possam despertar para uma nova experiência no conviver não somente com as mulheres, de igual para igual, respeitando-se as diferenças, mas em todas as circunstâncias onde o outro seja diferente de nós.

quarta-feira, 7 de março de 2007

ENQUANTO SE FALA EM BALA PERDIDA...

Anselmo Oliveira


O crime no Brasil vem se estruturando em segmentos que tornam o seu combate cada vez mais difícil. Enquanto os telejornais estão explorando a violência cotidiana de cidades como o Rio de janeiro e São Paulo os criminosos estão tranqüilos, planejando e executando seus delitos.
Observem que os assaltos a bancos passaram a ocorrer no interior do Brasil, onde a fragilidade dos órgãos de segurança é verdadeiro convite à prática do crime. O nordeste tem sido uma “terceira via” para os barões do crime organizado, na busca fácil de recursos por meio de roubos, aproveitam e lavam o dinheiro ilícito se infiltrando na sociedade local que não conhece a ficha criminal do agora pseudo empresário, fazendeiro e outros disfarces.
Um outro segmento que se estrutura em silêncio é o que tem como objetivo a corrupção e o desvio de verbas públicas. Se antes eram os escândalos que assistimos durante o ano passado com denúncias quase todos os dias de atos de improbidade praticados por parlamentares e gestores públicos, hoje, as manchetes sobre balas perdidas ajudam a tirar o foco da criminalidade do colarinho branco que age ciente da impunidade e da demora do nosso sistema judicial para alcançá-la.
Na minha ótica, tanto faz o PCC como os que se associaram para se locupletarem com o dinheiro público através das máfias das ambulâncias e das sanguessugas. O PCC usa da violência física e de terrorismo (buscando inclusive dar ares ideológicos à sua atuação), enquanto o seguimento da máfia que ataca o erário nas três esferas da federação usa de outro tipo de violência, que também mata milhões de brasileiros por falta de saúde, de higiene, de educação, enfim de condições básicas e no mínimo esperadas.
Enquanto isto, a polícia brasileira, especialmente a dos Estados, tanto a militar como a civil, está impedida de agir mais efetivamente em razão do abandono em que tal sistema de segurança pública vive. Baixos salários, péssimas condições de trabalho, e falta de capacitação são somados a inexistência de uma polícia técnica capaz de substituir a truculência pela inteligência, o autoritarismo pela autoridade.
Os discursos repetitivos tanto no meio parlamentar como no executivo não provocam mais fios de esperança. Ao contrário, estabelece uma doença coletiva, que pode ser até mesmo diagnosticada como “Síndrome do Pânico”, razão do abarrotamento dos serviços psiquiátricos e psicológicos em quase todos os Estados brasileiros.
O custo da violência do Brasil ainda não foi detalhadamente calculado. Aqui e ali economistas apontam somas que dizem indicar o peso no nosso tão pequeno desenvolvimento.
Não creio numa solução mágica. O Estado brasileiro deve investir tudo que puder em políticas públicas, porém não pode descuidar de tratar de outro paciente agonizante que é a segurança pública. Os homens e mulheres que atuam no sistema de segurança estão sofrendo tanto quanto a população que vive a mercê da criminalidade, até porque eles são do povo, e apesar de estarem quase sempre armados, vivenciam a mesma sensação de medo e abandono.

O MAGISTRADO

O magistrado contemporâneo tem que ser por formação um humanista, tem que valorizar a vida e todas as suas circunstâncias; tem que conhecer os seus jurisdicionados – do mais humilde ao mais poderoso – para cumprir com imparcialidade, mas sem distanciamentos da realidade, o seu papel de julgador.
Deve agir com autoridade sem no entanto ser autoritário. Há de ser enérgico sem perder a ternura. Há de ser justo e respeitar o Estado de direito. Há de ser probo e compreender que o seu trabalho é servir ao cidadão.
Enfim, todo o dia ao adormecer deve tranquilamente repousar sua cabeça sobre o travesseiro com a consciência do dever cumprido.

terça-feira, 6 de março de 2007

O RESGATE DA ÉTICA

Anselmo Oliveira
O advogado na recente história republicana brasileira tem sido um personagem importante para garantir, ainda que minimamente, a vocação democrática do povo brasileiro.

Não foi sem motivo que o constituinte de 1988 fez inserir na Constituição vigente no Capítulo III que trata do Poder Judiciário, a seção III dedicada ao advogado e à defensoria pública, consideradas funções essenciais à administração da justiça ao lado do Ministério Público.

A indispensabilidade do advogado ou do defensor tem fundamento na cláusula pétrea das garantias constitucionais do processo, especialmente a ampla defesa e o direito ao contraditório, art. 5º, inciso LV, da CF.

Há de se reforçar o papel institucional do advogado para a efetividade dos direitos fundamentais, e também para o aperfeiçoamento do estado democrático de direito tão abalado nos últimos anos no plano interno pela crescente violência urbana, pelo aumento das desigualdades sociais, e pela ausência do Estado no enfrentamento das causas dos problemas.

A crise ética que abala a vida republicana com os episódios fartamente divulgados na imprensa nacional que empobrece o papel do legislativo brasileiro por seus membros que adotam posturas antípodas ao perfil do representante do povo brasileiro serve também de exemplo e fomenta a necessidade de profissões como do advogado, do membro do ministério público, da defensoria e do judiciário sejam formados desde os primeiros bancos escolares até aos cursos de educação continuada ou de aperfeiçoamento de se aprofundar o ensino da ética para formar um patrimônio ético-moral que dê sustentabilidade ao papel reservado pela Constituição.

Essa reflexão deve ser o ponto maior das comemorações do dia do advogado, do dia da criação dos cursos jurídicos no Brasil, do dia do magistrado, 11 de agosto.

Acredito que existem avanços e podemos comemorar por isso. Todavia, existem também muitos caminhos para percorrermos em busca do aperfeiçoamento da Justiça brasileira, começando pela formação acadêmica do bacharel em direito que deve primar pelo retorno do humanismo como resgate da ética e da cidadania sem esquecer a formação técnica mais fundada na ciência do direito do que apenas na repetição dos textos legais.

Devemos formar bacharéis que pensem o fenômeno do direito e não apenas se habilitem a decorar os artigos das mais diversas leis. Devemos nos esforçar para que o embate jurídico promovido pelos advogados nos processos seja de alto nível e de efetivo compromisso com a verdade e que se pratique o que determina o Código de Processo Civil brasileiro que vai ter como princípio a lealdade processual a ser obedecido pelas partes, e, especialmente, pelos advogados.

Enfim, que esta data possa sempre ser comemorada com a esperança de dias melhores.

SOCIEDADE E VIOLÊNCIA

Anselmo Oliveira




Os senadores e deputados brasileiros se assanharam com a repercussão de mais um caso estúpido de violência no Rio de Janeiro que vitimou a criança João Hélio.
O foco da imprensa nacional centrou fogo no debate sobre a necessidade da redução da maioridade penal em virtude de um dos acusados do latrocínio ser um adolescente de 16 anos.
Os políticos se apressaram em defender, de acordo com o momento emocional, o que era mais convenientemente do ponto visto eleitoral, ou seja, seguindo a opinião das ruas desesperadas com o nível insuportável da violência no Brasil.
Desejo convidar você para fazer uma reflexão a partir das causas que geram a violência, e não dos efeitos, pois estes nós já conhecemos.
A sociedade é parte dessas causas, e dela ninguém escapa à responsabilidade que tem neste processo gerador da violência, seja pela opção consumista e individualista que adotamos, seja pelo imenso vão que separa a elite dos mais pobres: a desigualdade é um dos fatores a instalar no dia-a-dia da sociedade a violência.
A sociedade também é culpada pela hipocrisia no tocante ao consumo de drogas – e não falo dos maconheiros e dos viciados em crack da periferia – falo daqueles que usam e os filhos também usam mas se sentem imunes à ação da polícia e da justiça pelo poder que possuem, seja econômico, político ou social, e à vezes se auto-proclamam não violentos.
A sociedade dá causa à violência quando uma parcela pequena e nem por isso insignificante se apropria dos recursos públicos via corrupção e desvios de verbas que deveriam ser utilizadas na educação, na saúde, no saneamento e melhoria da qualidade de vida do povo mais humilde.
A sociedade é culpada quando escolhem mal os seus representantes para o legislativo, e estes se preocupam apenas em se manterem no poder, em conquistar “currais” eleitorais, em aumentar o “poder de fogo” capaz de torná-los imbatíveis nas próximas eleições.
A sociedade é culpada quando escolhem pessoas para cargos no executivo que não tenham preparo intelectual e moral para gerir a coisa pública.
Os atos de selvageria e de brutalidade que estamos assistindo são apenas os efeitos, as conseqüências de atos e de omissões da sociedade e do estado brasileiro.
Mudar a lei desviando o olhar das causas do problema não reduzirá a violência.
Mudar a lei e manter o modelo falido do sistema penitenciário brasileiro, onde os grupos organizados de criminosos mandam, apenas aumentará a violência.
Mudar a lei para extravazar um sentimento de vingança e de medo que a sociedade experimenta nesse momento, apenas reduz momentaneamente a nossa dor, é como um analgésico para um doente terminal.
Necessitamos resgatar valores, reduzir a desigualdade, investir na educação fundamental de qualidade, desenvolver este país para criar mais oportunidades de inclusão social.
O resto é pura demagogia.