domingo, 22 de abril de 2007

COMBATENDO O CRIME ORGANIZADO

“Somente num verdadeiro Estado de Direito Democrático é que se vê a prisão de autoridades do judiciário, inclusive de Tribunais, sem que isso represente nenhuma ruptura política.”

As manchetes jornalísticas da semana são dedicadas ao crime organizado que se infiltra perigosamente em todos os segmentos da sociedade e do estado brasileiro.
Antes de mais nada é preciso que a sociedade saiba que o combate ao crime organizado só é possível porque existem juizes sérios, honestos e corajosos, ao lado de membros do ministério público, destemidos e também honestos, e com o auxílio indispensável de policiais sérios e competentes buscaram descobrir o que apenas se imaginava quanto ao funcionamento do crime organizado.
O fenômeno da globalização também foi significativo para as operações criminosas que antes se manifestavam localmente, regionalmente ou nacionalmente. Agora, seus tentáculos são transnacionais. Seu poder de corrupção e de intimidação é muito maior.
As organizações criminosas funcionam como verdadeiras multinacionais do crime, e a sua face contemporânea tem claramente o lucro por objetivo, não importando os meios, violentos ou de suborno, o que verdadeiramente interessa é o resultado.
Para atingir seus objetivos organizacionais seus membros não poupam esforços para a infiltração nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Buscam não somente a blindagem para a prática dos crimes, mas também poder.
Numa rápida olhada para o passado recente e cuja luta continua, embora menos acirrada, a máfia italiana sofreu vários revezes, e apesar de muitas prisões e condenações exemplares, o fantasma do crime organizado ainda persiste em cidades do sul da Itália, principalmente.
Outro exemplo, o da Colômbia, apesar do embate duro do governo colombiano para destruir os grupos organizados de narcotraficantes, e da melhora significativa no controle da segurança pública daquele país, criminosos ainda conseguem produzir e traficar uma imensidade de toneladas de cocaína para os Estados Unidos e países da Europa.
No Brasil, estamos no começo de uma luta que não depende somente dos poderes constituídos, depende também da sociedade. O apoio do povo às ações empreendidas contra o crime organizado é bastante para pressionar os deputados federais e senadores a votarem as leis que são indispensáveis para a efetividade da jurisdição penal.
Como foi declarado pela própria polícia federal de que há o envolvimento também de parlamentares, se tem a certeza que aqueles que foram eleitos com o apoio, inclusive financeiro, dos caciques do crime no Brasil, estes não têm condições morais para votar em leis que facilitem as forças legais combaterem com eficiência e eficácia os malfeitores.
É preciso que os veículos de comunicação fiquem atentos para cobrir com transparência os fatos, cuidando de não fazer juízos precipitados, porque o mais comum nesse tipo de combate é atingir muita gente, às vezes que não tenha nada com o crime, mas circunstancialmente aparente ter alguma ligação. O preço é muito alto caso se comprove que foi apenas uma suspeita.
A cautela na cobertura é para garantir que não se descambe para uma caça às bruxas, mas para, de certa forma, exigir que as autoridades responsáveis cumpram seus papéis sem obstáculos e sem pressões.
Viver numa sociedade democrática significa respeitar valores básicos mesmo quando se tenha como objetivo chamar a atenção de forma sensacionalista.
Somente num verdadeiro Estado de Direito Democrático é que se vê a prisão de autoridades do judiciário, inclusive de Tribunais, sem que isso represente nenhuma ruptura política. Apenas sendo o cumprimento da lei através de uma ordem expedida pelo próprio Poder Judiciário.
Como magistrado, ao mesmo tempo em que me entristeço com o envolvimento de pessoas até então considerados acima de qualquer suspeita, sou tomado de uma grande alegria de ver que é possível exercer com dignidade a magistratura mesmo que para isso tenha que se cortar a própria carne.

domingo, 8 de abril de 2007

DIREITOS DE FRATERNIDADE E O FUTURO DA TERRA

Anselmo Oliveira

“A nova lógica, vista pela ordem jurídica, especialmente pelo direito internacional, seria a lógica dos direitos de fraternidade, como direitos de quinta dimensão.”

O terceiro relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC) da ONU, divulgado na sexta-feira passada, 06 de abril, destaca os efeitos do aquecimento global para as regiões polares do planeta e as conseqüências para o resto do mundo.
Infelizmente os grandes investidores e os principais governantes não parecem levar a sério os avisos dos cientistas para a possibilidade a médio prazo de calamidades em escala mundial, principalmente para a escassez de água potável e de alimentos.
Hoje, um terço da população vive abaixo da linha da pobreza, isto significa mais de um bilhão de pessoas, e o relatório aponta que as regiões onde grandes mudanças climáticas trarão mais calamidades são exatamente onde se encontram as populações mais pobres, notadamente da Oceania, Ásia e África.
Parece que países desenvolvidos e os maiores responsáveis pela poluição junto aos grandes grupos industriais internacionais buscam desqualificar o relatório do IPCC, e ao que parece apenas um único motivo: manter o nível econômico. Pelo menos tem sido a explicação dada pelo presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, para não reduzir as emissões de carbono, um dos vilões do aquecimento global, mesmo quando a Suprema Corte Americana já decidiu a semana passada que é constitucional a determinação de redução índices de emissões por agência governamental norte-americana, numa clara intenção para tirar do chefe do executivo dos Estados Unidos o poder supremo sobre a questão.
Inacreditável que tudo isto aconteça quando o mundo assistiu na última reunião dos países mais ricos do mundo em Davos, na Suíça, exatamente a preocupação de investidores e governantes com a questão climática. Será que tudo não passou de empulhação?
A preocupação que se tem com o relatório divulgado na última sexta-feira, 06, é que sabendo que as populações que mais sofrerão os efeitos serão as mais pobres, as periféricas, as sem renda, incapazes de consumir os bens fabricados pelos mais ricos, de maneira ignomiosa os defensores dos ricos vejam nisto uma solução, reduzindo a população africana, asiática e de outras regiões subdesenvolvidas, como se a “natureza” providencialmente fizesse uma seleção natural.
Penso que na verdade está em curso um grande genocídio, um crime não contra etnias, ou minorias religiosas, mais o maior crime contra os mais pobres, os que não representam esperança de lucros, ao contrário, significa investimentos pesados em educação, saúde, infra-estrutura, segurança pública, cujos recursos teriam que sair a fundo perdido dos países mais ricos.
A lógica perversa do capitalismo é a grande causa dessa que pode ser a maior chacina em escala global, e aqui não haverá um nome apenas para se expiar a culpa, mas todos aqueles que pensam na pobreza como um óbice ao desenvolvimento, ao abastecimento de alimentos e de água potável, ao bem estar dos ricos.
Há vinte anos escrevi sobre o tema na Gazeta de Sergipe lembrando que a lógica do capitalismo, a lógica dos mercados consumidores, na extinção de futuros mercados será a negação dessa mesma lógica.
O fim do capitalismo não está na luta ideológica, nas revoluções armadas, nos populismos. O fim do capitalismo está na morte dos mercados.
A nova lógica, vista pela ordem jurídica, especialmente pelo direito internacional, seria a lógica dos direitos de fraternidade, como direitos de quinta dimensão.
O reconhecimento da existência de direitos sob a ótica da fraternidade é a saída para que o planeta Terra sobreviva aos impactos econômicos, sociais e climáticos.
Não se trata de caridade, solidariedade apenas, mas do reconhecimento de que sem garantir o mínimo de dignidade a todas as pessoas, mesmo reduzindo o crescimento econômico dos mais ricos, mesmo freando os impulsos ditados pelos mercados, não haverá futuro.

terça-feira, 3 de abril de 2007

CAÇA AOS PARLAMENTARES QUE MUDARAM DE PARTIDO

Anselmo Oliveira

“Será preciso uma provocação dos partidos interessados que pode ser inicialmente no âmbito do próprio Poder Legislativo respectivo, e este poderá reconhecer o direito já declarado pelo Judiciário.”

O assunto principal na mídia brasileira na última semana foi a decisão do Tribunal Superior Eleitoral por seis votos contra apenas um, em resposta a consulta de n.º 1.398, formulada pelo Partido da Frente Liberal, agora Democratas, com o seguinte teor: “Os partidos e coligações têm o direito de preservar a vaga obtida pelo sistema eleitoral proporcional, quando houver pedido de cancelamento de filiação ou de transferência do candidato eleito por um partido para outra legenda?”

Numa decisão histórica e atendendo aos princípios constitucionais e também do direito eleitoral brasileiro, a maioria absoluta dos Ministros da maior Corte Eleitoral do país, respondeu afirmativamente.

O fundamento legal de que o sistema proporcional eleitoral adotado pela Constituição brasileira nos arts. 14, § 3º e 45, é suficiente para concluir pela resposta adotada pelo TSE de que o mandato pertence ao partido ou coligação pelo qual foi eleito o deputado estadual ou federal e o vereador, pois são eleitos pelo sistema proporcional.

Podem questionar o fato de somente agora o TSE ter se posicionado em relação ao tema. Para os que não dominam o conhecimento jurídico é preciso explicar que o Poder Judiciário não pode decidir sem existir uma provocação, consistindo isto um dos princípios basilares do funcionamento da justiça que tem o nome de “inércia da jurisdição”.

Significa o princípio da inércia da jurisdição que a manifestação do Poder Judiciário deverá sempre ser provocada pelo interessado. Nesse caso, o Partido da Frente Liberal (agora, Democratas) provocou a Justiça Eleitoral ao fazer a consulta.

Importante que as pessoas saibam quais os efeitos de uma decisão como esta. A consulta perante a Justiça Eleitoral tem o efeito declaratório. Vale dizer que se tornou público que a Justiça eleitoral brasileira reconhece que o mandato do parlamentar eleito pelo sistema eleitoral pertence ao partido ou coligação que o elegeu, e assim, no caso de desfiliação ao mudar de partido, poderá o eleito perder o mandato e em seu lugar ser chamado o suplente do partido ou coligação.

Por se tratar de uma decisão de natureza declaratória não ocorrem efeitos materiais. Ou seja, simplesmente com a decisão do TSE não vai haver a perda imediata dos parlamentares que mudaram de partido. Será preciso uma provocação dos partidos interessados que pode ser inicialmente no âmbito do próprio Poder Legislativo respectivo, e este poderá reconhecer o direito já declarado pelo Judiciário. Porém, no caso do Legislativo não entender que deva aplicar o entendimento do TSE, restará aos interessados provocar o Judiciário para obter agora uma decisão cuja natureza será mandamental, que significa obter uma ordem judicial para que o Legislativo se obrigue a dar cumprimento ao entendimento já declarado.

Não se tem dúvida de que esta decisão do TSE reforça a democracia e consolida os partidos em sentido ideológico, e afasta da cena política aqueles políticos que usam os partidos como peças do seu guarda-roupa, descartando quando cair de moda, ou quando perdeu o gosto de usar.

Muitos políticos certamente estão detestando a decisão do TSE porque de modo indireto está reforçando a fidelidade partidária, instituto partidário desrespeitado pelos políticos que enganam os eleitores que votam pensando em coelhos quando na verdade são lebres.