O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei 8069 de 13 de julho de 1990, faz este ano 18 anos. Atinge a maioridade e continua na sua primeira infância.
Cuida o ECA da proteção da criança e do adolescente, em razão da Constituição de 1988 que define que estes têm direito à proteção e que a responsabilidade é da família, da sociedade e do Estado.
A legislação brasileira traz luzes para a definição de políticas públicas a serem efetivadas pelo poder público, desde aquelas voltadas para a maternidade e assistência pré-natal até a educação da criança e do adolescente.
Apenas uma pequena parte do ECA, dos 267 artigos apenas 25, é que vai cuidar da situação do adolescente infrator e determinar quais as medidas possíveis dentro de uma visão sistêmica.
Não pode se imputar ao ECA o aumento da criminalidade juvenil, e nem mesmo que o tratamento dado seja pouco rigoroso.
O problema da criminalidade juvenil tem várias causas, a exemplo da desigualdade social crônica do Brasil que contribui para o esfacelamento das famílias, o nível de instrução da grande maioria das crianças e dos jovens brasileiros, a violência na família e na comunidade, o uso de drogas e de álcool, a ausência de atendimento social e psicológico às crianças e jovens em situação de risco, a ausência de programas de formação profissional para os jovens e também de lazer, entre outras políticas que visem o desenvolvimento integral da criança e do adolescente.
Do outro lado, quando o jovem ingressa na criminalidade o Estado não oferece o tratamento adequado logo de início, quando existe a possibilidade de se recuperar. As medidas sócio-educativas cumpridas em ambientes totalmente inadequados, onde não são respeitadas as faixas etárias, as condutas tipificadas como crimes praticados pelos jovens, e também, mais uma vez a omissão do Estado que não cumpre a legislação em vigor, preferindo seguir o caminho das nossas prisões onde também a lei é desrespeitada pelo próprio Estado.
A sociedade somente acorda quando casos pontuais deixam-na assustada, como tem sido o caso do adolescente apelidado de “Pipita”, que daqui a pouco será transformado em mito, e como tal, todos os crimes ocorridos na região onde passou a ser temido, segundo a imprensa, serão imputados a ele. Aliás, antes mesmo de ser feita qualquer investigação mais séria, antes mesmo do devido processo legal, já se espera do Estado a punição, preferencialmente “exemplar”.
Alguns radialistas no auge do populismo insano e irresponsável já se manifestaram veladamente pela simples eliminação do adolescente, em outras palavras, a execução da pena de morte que no Brasil somente é admitida em caso de guerra externa.
O direito ao devido processo legal, garantia constitucional conquistada após séculos de abusos e de injustiças, na ótica desses que se arvoram como “voz do povo” não vale nesse caso.
O combate à criminalidade juvenil deve ser objeto de planejamento estratégico dos órgãos da segurança pública respeitando a Constituição e as leis.
Não podemos criar mitos sob pena de obscurecermos a verdade: a omissão da sociedade, do Estado e da família.
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ResponderExcluirE de quem é a culpa!?
ResponderExcluirBrilhante são as observações do Prof. Anselmo!
Vale analisar sobre o referido artigo, os responsáveis (família, sociedade e Estado) pelos fatos ocorridos, seja direta ou indiretamente, por atos tão atrozes presenciados todos os dias, e que tomamos conhecimento apenas quando se chegam a tamanhas proporções. Onde tomamos como válvula de escape apenas a capacidade de julgar e culpar a própria “VÍTIMA” (no caso, o jovem Pipita) ou o próprio ESTADO, já que é a autoridade responsável competente. Não percebendo a culpa por parte familiar na formação do indivíduo, e da sociedade como papel essencial no acompanhamento e na solução devida dos problemas sociais. Problemas estes resolvidos apenas como uma pedra que se retira de um calçado, excluindo ou exterminando da sociedade.
weestna@hotmail.com
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Anselmo concordo com você, em número gênero e grau. O absurdo disso tudo é que pessoas que se dizem cultas, aquelas das quais se espera uma visão mais sistêmica da situação, comemoraram a "execuçâo" do adolescente Pipita. Ou seja o Estado, que deveria cuidar, prevenir, através de políticas, não o faz, e para disfarçar a sua incompetência, caçou o jovem, julgou e puniu com a pena de morte. É assim que lidamos neste país com os pobres!
ResponderExcluirSDS Valdic Barbosa
Dr. Anselmo, assisti sua palestra, ontem, 17, no Tribunal de Justiça e parebinizo a sua explicitação que foi de extrema valia para minha formação profissional.
ResponderExcluirConsidero a conduta do Adolescente em conflito com a lei, Cleverton Santos, apelidado de "Pipita", um fruto do sistema virgente no Brasil.
Em um país, onde as desigualdades sociais são gritantes, o nível de educação pública é baixo, e existem poucos investimentos no setor humano, por vezes, o universo infanto juvenil se encontra a margem da sociedade de direitos, e ainda é "apedrejado" pela mesma.
Já diria um teórico que nenhum ser humano nasce ruim, a sociedade é quem o corrompe.
Ora, vivemos em um país que se investe tanto em tecnologia, e se esquece de investir no ser humano. O Estado precisa lembrar que ele mesmo é o "criadouro" de adolescentes, que entram para o mundo da criminalidade. Uma situação que merece reflexão e não, julgamento por parte da mídia, e da população sergipana. Infelizmente, sem criticidade, as pessoas reagem aos apêlos dos veículos de comunicação, que por vezes, esquecem da responsabilidade social, na busca desenfreada pela audiência e para que se esgotem os exemplares dos jornais nas bancas. Afinal, a cultura da paz não rende capital.
Mas, por quê a sociedade corresponde positivamente a certas empresas que agem como se tivessem o direito de julgar o céu e a terra? Quem é capaz de garantir que o Cleverton Santos foi realmente mandado para o quinto dos infernos?
O que me entristece é que discutimos ética nos bancos da universidade, mas, tenho convicção que quando nos lançarmos pra o mercado de trabalho estaremos com as "mãos amarradas" pela linha editorial que vendem o terrorrismo.
Já dizia uma professora minha, Henriete Cabral, que o capitalismo é como um povo com vários tentáculos que agarram até as relações de trabalho.
Parabéns por fomentar discussões mais profundas a cerca da cobertura jornalística e do direito.
ATT, Tamires Santos, 20 anos.
Estudante do 6º período de jornalismo.
Blog: www.tamiressantosjornalismo.blogspot.com
Concordo plenamente com a Tamires, a nossa imprensa, com raríssima exceção, tem a triste mania de julgar como se fosse juiz. O mundo em que vivemos é fruto do que somos e do que praticamos no passado. Se o adolescente de hoje tem se transformado em pessoa ruim, criminosa, a culpa está em nós mesmos, nesta sociedade hipócrita e egoísta em que vivemos.
ResponderExcluirA imprensa antes de qualquer julgamento, se é que ela tem o direito de julgar alguém, deve primeiro respeitar as leis, e acima de tudo, as famílias desses adolescentes que sofrem com a sua mudança de personalidade. Elas são vítimas de um sistema perverso que corrompe as pessoas e as conduzem ao caminho da destruição.
Que a sua reflexão, Tamires, sirva de lição para os inúmeros jornalistas sensacionalistas e antiéticos.
ATT, Paulo Sousa - graduado em Jornalismo, diretor de Jornalismo da 103 FM, e editor da revista Lojistas & Cia.